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Seres vivos e radiantes como o Sol.

A pequena mosca azul metálico voa em minha direção, fugindo do olhar da rosa na escuridão do lustre, enquanto não há mais tempo. Preciso apenas lavar o rosto e as mãos com sabonete líquido com perfume de alfazema e lembrar-me das dezenas de rostos anônimos que vi ainda há pouco na feira de artesanato escolhendo brincos, enquanto na televisão Batman e Robin perseguiam o duende verde, trombando contra extintores de incêndio vazios, pendurados em paredes falsas e mofadas.
  
Como duas azeitonas portuguesas e saio do breu escovando as gengivas, que sangram de encontro à banca de jornal. Revejo sem propósito algumas revistas pornográficas Private, Penthouse, revistas de esportes e filosofia, miniaturas de locomotivas e palavras-cruzadas.

Ultimamente tenho lido sobre yoga da renúncia, desapego, sobre como purificar a alma e livrar-me de uma vez por todas desses dejetos que me chegam à mente através dos sentidos, mas não consigo nunca evitar que minha visão caia nesse ralo imundo da cultura humana.

Como depois mamão, escarola, beterraba e nabo, agrião, escarro e escovo os dentes. Tomo todos os dias, bem cedo em jejum, suco de dois limões, mas não consigo evitar esse redemoinho maldito do Tempo. Gosto ainda de chupar manga à noite e de pessoas bonitas, saradas e divertidas. Olhar alegre e borbulhante, sorriso gritar
no canto da boca, e não perco nunca de
vista minhas convicções e valores mais íntimos, que agora removo com uma pinça da superfície dos olhos, observando no espelho mamãe raio laser. Ajeito o nó da gravata e vejo que Deus está me tornando externamente cada dia mais feio e abobado que antes. Meu rosto está ficando redondo e deformado, eu diria que ovalado  como uma batata
inglesa e meus fios de cabelos, que antes eu chamava de topete, sêcos e
feios como um velho saco de estopa, pendendo entre os chifres.  Às vezes me sinto parecido com uma velha formiga, outras vezes tenho a impressão de ser o xerife ou um cowboy que esqueceu o cavalo perdido em algum canto do universo. Criança não pode bater a cabeça. Eu amo Deus. Amo toda a natureza gostosa e desvio do que é feio, como a água da chuva desvia das saliências do terreno. Sou como a formiga que deposita grão por grão de areia ao redor da boca do formigueiro, sem pensar em nada, acreditando que fará Sol amanhã, não e não
chuva.

Apenas olho para a linha do horizonte a fim de poupar alguma energia,
desejando ter a pura energia da b
orboletinha amiga, tão divertida, e me abaixo, esquivando-me da mosca azul. Com criança não se brinca, sabia?

Outro dia me roubaram um beijo proibido, mas muito verdadeiro. Pela manhã levei meu casal de Sandy e Júnior ao dentista na Rua Oito em Nova Veneza para tomar Sol. Eu podia voar como um cavalo doído, apesar da tristeza translúcida implícita em seus olhares, mas que eu imaginava ser apenas o início de um sorriso falso.
Após outra xícara de Raio-X na parede branca da sala de espera, olhando pinturas a óleo, mas na verdade via apenas uma luz
piscando à distância na sala ao lado.
Eu estava totalmente esverdeado de raiva, indicando a direção que penetrava ser correta. Não podia imaginar que meus dois hot-dogs seriam seqüestrados naquela manhã imunda pelo Dr. Pimenta Vermelha. Oh, my dog! Eu nunca mais poderia imaginar o frio que me corroia os ossos tratava-se na verdade de um pelotão de Caveiras Carecas, aguardando atrás da porta do armário de aço o
momento exato para entrarem em ação. Estrela louca, fotografe esse momento
psicodélico que flui como um Bel-Air no centro do Vortex. Deixe os dois Dinossauros Dorminhocos na porta do consultório do dentista e espirre para sempre na buzina do meu volante.

Nesse momento, porém, de tanto medo, soltei alguns centímetros cúbicos de gás, e acionei a
campainha junto à porta, ao lado dos extintores. “Ele teria que sair por ali” - pensei. Teria que me devolver aquelas duas crianças intactas, da mesma forma que eu as havia deixado ali na varanda naquela manhã. Assim, de súbito uma voz masculina, fininha e robótica vazou pelo pequeno orifício negro que se movia na porta, dizendo entre os dentes algo que, apenas mais tarde, em meu quarto escuro, com a cabeça coberta, morrendo de medo, eu pude decifrar: "Podem entrar, meus gordinhos”. Eu nunca poderia imaginar sozinho o que estou falando agora. Estou ficando cego e cagando letras analfabéticas no sofá. Preciso da sua ajuda para anular esse cheiro de esfiha que penetra datilografando pela janela dos fundos dos meus sonhos



"Nunca desista dos seus sonhos
Procure em todas as padarias
até encontrá-los" 


Dizia a voz abafada ao telefone

Ouvia em seguida um cachorrinho branco latindo no centro dos quadros com paisagens marítimas pendurados na parede. Alguém deve estar chamando meu nome na sala ao lado?
A mosca pousa em meu rosto e eu cerro os pulsos.

-         Você não passa desta tarde, Flake!
-         Ora, vai se foder, Dr. Pimenta! Pare de falar besteiras e vê se presta atenção na pista.

À noite, na kit, mesmo munido com uma pequena lupa, mal conseguia ler as bulas dos meus remédios. Senti dores no lado esquerdo do abdome e, em seguida, ouvi a risada de algumas lombrigas mergulhando no intestino. Ou seria a chuva forte que caía lá fora?

A água doce escorre pelo pára-brisa da Belina, me impedindo de ver a sinalização, de perceber até mesmo a exata posição da pista. As criancinhas dormem no banco de trás como anjinhos. Estou ficando trêmulo como uma bandeira palestina. Não tenho a bestialidade de antigamente para ficar camuflando idéias cheias de detalhezinhos cor-de-rosa com cobertura de chocolate. Rapo a planta sagrada, como a saúva faz com a roseira, e prefiro sentar-me sossegadamente na
catapulta à porta da jaula, esperando o momento em que
alguém puxe o raio do cordão, e me atire de volta ao passado ou me lance novamente ao futuro. Só não quero mais ficar aqui nessa brecha gosmenta do tempo tomando Coca-Cola na janela e arrotando, enquanto moscas coloridas revoam  entre os pingos da chuva. Busquei
O
Almoço
Na
Bosch
Bati
Uma vitamina de abacate no liquidificador, enquanto a Dona Leda terminava seu fastidioso ritual de higienização
no escritório. Todo dia tirando pó das mesmas mesas, pegando cestinhos de lixo repletos de papel picado.
Todo dia a mesma merda continua fedendo e ela não suspeita de nada. Coitada. Muito pelo contrário. Por um mísero salário mínimo se ajoelha, esfola os dedos enrugados no chão e nos azulejos, sem saber que tudo acaba, mas nada tem fim.
 Puxei a descarga em forma de trança rastafari e não ganhei
mais nenhum beijo, Penso, então que, desse modo, meu Irmão evangélico poderia até estar certo em
querer me derreter para sua religião -
BAD RELIGION. Fecho a janela e volto
à
minha micro-cela de serial killer. It’s The Mistery. Nós somos a psicologia. Nós somos os assassinos psicológicos que mora com a família na casa ao lado. Eu posso lembrar-me do policial de aço
assassinando miseráveis para escalar a pirâmide social. Eu vi os grandes homens do fogo
dormindo em sofás de couro, atrás das nuvens de algodão doce, cheirando a éter e xylocaína eu 
 pensava que meu pai era Deus que o filme que eu assistia naquela tarde entrecortada na esquina da Amaral Gama com a Alfredo Pujol fosse apenas ficção, mas não era. Hoje, 23 anos depois daquela tarde, ainda ouço
a música desafinada que o inseto insuportável tocava na escuridão do quarto,
enquanto o assassino psicológico não vem mais me falar sobre as horas.
Onde o nada pode ser previsto, e a placa de bronze de “Super-Homem”, pendurada no portão, conta mentiras às crianças, sentado de lado como um príncipe à beira de suas camas. contornando o rabo  As pessoas não deveriam mesmo
falar comigo nessas horas ler o que escrevo a pão e água a ferro e fogo.
Não deveriam mesmo imprestazzione se importare comigo no ambient me pavore mandar a cama como bananas d
e pijama Bananas de Pijama? Talvez eu faça as malas esta noite me analisando. Talvez seja mais
fácil e conveniente comportar-se como um narcisista disfarçado de cônego, que um frade nazista que faz a barba sem usar óculos e urina com o pinto duro sem respingar nos azulejos. Quem sabe seja melhor retomar o
quanto antes à pintura daqueles quadros esvaecidos e aos exercícios de respiração
yoga e às doses diárias de ferro e vitamina-C do meu cereal Kellogs e do Ovomaltine do meu avô, do que ficar sentado no alto dessas colinas no meio de galinhas caipiras, mudando de poleiro ao relento. Talvez seja melhor eu levantar-me todas as
manhãs dessa cadeira fumegante e atravessar correndo a avenida
movimentada de olhos fechados e cheia de estrelas, bem na frente dos automóveis e liberar de uma vez por todas o prêmio daquela maldita apólice de seguro de vida
obrigatória.

Dona Leda me irrita, passando diariamente seu pano
de chão encardido no banheiro, bem
à minha frente, em total silêncio e abandono, como se estivesse com medo do meu olhar de mosca morta, ou rindo por dentro, como se pertencesse a alguma CISH (Categoria Inferior de
Seres Humanos), Ela não
ri, não libera as emoções, as expressões faciais para que eu
possa ver a cor e o estado dos seus dentes.



A doutrina sobe lentamente a
escada de seis degraus do escritório, carregando sua pasta
007 cheia de papéis e
comprimidos para o coração. Eu chupo mais alguns drops de tangerina, de olho nas pastilhas Valda que estão na mesa ao lado. Mais um dia de morte,
trancado na poderosa jaula cheia de válvulas e lantejoulas. Vozes militares familiares
correndo pelos labirintos do tempo. Faces esburacadas, cadáveres desaparecidos na Via Lactea a cada pulsar do cursor na tela do computador. Há apenas dois
mundos do Lado Externo e Cheio de Pulgas, embaixo
de cada tapete, atrás do olhar entre franjas desses pequenos burgueses, aspirantes ao pó de Deus.
Contudo, há uma cisão, uma questão existencial humana, psicológica, individual e ao mesmo tempo coletiva, que se coloca, como um enigma; mais um pequeno detalhe de um mistério maior, e que, no entanto, da forma como está colocada, essa... "realidade social" ou, o sistema, não contempla, não considera, não aborda. Em resumo, ignora


Há apenas um odor horrível de merda no ar e um rotor ligado no consultório do Dr. Pimenta, o dentista mercenário Mas até o momento nenhum cu foi identificado pela polícia. Nunca mais me convidaram para outro café com chantilly, nem elogiaram mais a cor vagabunda
dos meus olhos sensíveis à tantra Luz.



Por isso, é com orgulho que visto meu velho AllStar preto de lona, meu jeans rasgado e uma das  minhas duas camisetas favoritas, a preta ou a lilás, e volto a dormir ouvindo os pássaros.